Médico que denunciou ‘kit Covid’ diz ter sido ameaçado por diretor da Prevent Senior

Relato foi entregue à CPI após surgimento de dossiê com omissão de mortes; empresa nega ‘qualquer ameaça a colegas’

BRASÍLIA

​Um médico que denunciou a prática da Prevent Senior de prescrever remédios do chamado “kit Covid” para pacientes disse ter sido ameaçado e coagido pelo diretor-executivo da operadora de planos de saúde, Pedro Benedito Batista Júnior.

Nesta quarta-feira (22), Batista Júnior deverá prestar depoimento na CPI da Covid. Ele será ouvido por senadores após o surgimento de denúncias de que hospitais do grupo são espécies de laboratório para indicação de medicamentos sem eficácia contra a Covid-19.

Fachada do hospital Sancta Maggiore, da Prevent Senior, na rua Maestro Cardin no Paraiso, zona sul de São Paulo
Fachada do hospital Sancta Maggiore, da Prevent Senior, na rua Maestro Cardin no Paraiso, zona sul de São Paulo – Rubens Cavallari – 20.mar.20/Folhapress

Segundo um dossiê assinado por 15 médicos, profissionais eram coagidos a prescrever remédios como hidroxicloroquina sem consentimento de parentes dos pacientes e eram obrigados a trabalhar mesmo quando infectados com o coronavírus.

Um dos médicos que realizou as denúncias gravou a conversa telefônica de uma ligação com Batista Júnior, após ter relatado irregularidades à imprensa, sob condição de anonimato.

A conversa telefônica se deu no dia 9 de abril deste ano, por volta das 8h. O denunciante afirma que a conversa se deu “em tom de intimidação”.

O áudio e os documentos sobre o caso foram obtidos pela Folha e também estão entre os arquivos sigilosos da CPI da Covid. O profissional ainda registrou as ameaças em um boletim de ocorrência na Polícia Civil de São Paulo contra Batista Júnior.

O registro também foi anexado a um processo que o médico responde no Cremesp (Conselho Regional de Medicina), a pedido da Prevent Senior, por “vazamento de prontuários”, em seus depoimentos.

Em uma nota breve, a assessoria de imprensa da Prevent Senior afirmou que “o dr. Pedro Batista Júnior nega qualquer ameaça a colegas”. À PGR (Procuradoria-Geral da República) a empresa disse ser vítima de armação e pediu investigação do caso.

O médico, cujo nome será mantido em sigilo, teria denunciado que profissionais de hospitais da Prevent Senior eram obrigados a prescrever medicamentos do “kit Covid”, sob pena de serem até mesmo demitidos.

Ele próprio também relatou que foi obrigado a trabalhar em um plantão, mesmo estando infectado pelo novo coronavírus.

Após ter feito as denúncias, ele recebeu um telefonema de Batista Júnior, no qual o diretor-executivo indica que vai prejudicar o médico profissionalmente e chega a mencionar que o ex-funcionário iria desta forma “expor sua filha, sua família”.

Por isso pede que o ex-funcionário retire o depoimento e as denúncias feitas à imprensa, sob anonimato, contra a empresa e afirma que o médico “tem muito a perder”.

“Você não ganhou nada com isso. Eu vou pegar cada um dos prontuários dos pacientes que você não tratou e vou mostrar quantos deles foram para a UTI [Unidade de Terapia Intensiva]. É isso que eu vou mostrar, porque eu tenho que provar alguma coisa”, afirmou o diretor-executivo na conversa telefônica.

“E sabe o que eu vou provar? Eu vou provar que você mentiu. Vou provar que você é um cara antiético, que você é um dos caras que tinha compliance [queixas na empresa]. Eu vou levar tudo isso, cara”, afirmou.

O médico então questiona quais as denúncias pesavam contra ele e o que teria deixado de fazer eticamente no período de trabalho na Prevent Senior.

“Agora não interessa mais. Agora não é mais problema seu. Agora é um problema do mundo, que você jogou pra cima. Entendeu? E você vai sujar o seu nome”, respondeu o diretor da empresa.

Batista Júnior em seguida afirma que o ex-funcionário vai expor toda a sua família com a denúncia contra a operadora de saúde. O médico se exalta e pergunta se estaria recebendo uma ameaça.

O diretor-executivo fala que não está realizando nenhuma ameaça e repete essa versão em diversos momentos da conversa. E completa que estava fazendo a chamada telefônica ao lado de um advogado, justamente para tentar provar que o médico estaria tentando desvirtuar a conversa ao dizer estar sendo ameaçado.

“Eu só te falei isso nessa ligação: você tem muito a perder, é sua filha, sua família, que vai ser exposta por uma mídia que hoje destrói tudo”, afirmou.

Além de ter efetuado a gravação, o médico registrou no boletim de ocorrência que Batista Júnior seguiu na conversa “com ameaças contra a esposa e a filha”.

Fonte: folha.uol.com.br

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